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Espiritualidade prática, com Debora Pivotto

Espiritualidade e autoconhecimento conectados com a nossa saúde física e mental, com o coletivo e com a vida prática
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Por que temos tanta vergonha de chorar?

Por Debora Pivotto
Atualizado em 21 out 2024, 22h28 - Publicado em 19 Maio 2021, 21h36
Mulher com as mãos no rosto
 (Pixland/Thinkstock/Getty Images)
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Desde criança eu tenho uma facilidade incrível para chorar. A expressão “segurar o choro” nunca me fez muito sentido. Porque chorar nunca foi uma opção pra mim, é algo que simplesmente acontece. É quase um fenômeno meteorológico do meu mundo emocional.

Hoje eu vejo essa facilidade com as lágrimas como parte essencial de quem eu sou, quase como um dom. Mas durante muito tempo eu briguei e reneguei essa minha sensibilidade. Costumava brincar que se houvesse um curso que ensinasse a falar de coisas profundas sem cair no choro, eu seria a primeira a me matricular.

Na época da faculdade, ganhei dos colegas o “carinhoso” apelido de Pé de Pano, que era o cavalo do Pica-Pau no desenho animado e que sempre chorava quando estava em apuros. E se na faculdade, meu choro fácil era motivo de piada, no mundo corporativo, era praticamente proibido.

Perdi as contas de quantas vezes eu chorei escondida no banheiro das redações por onde passei. E em outras tantas vezes fui julgada como fraca ou desequilibrada por não conseguir conter minhas lágrimas durante uma DR com o chefe ou reuniões tensas de equipe. Já ouvi de um colega o “conselho” de que chorar daquela forma no trabalho pegava muito mal.

Mas o fato é que chorar é muito saudável. É uma reação muito natural e instintiva do nosso organismo. É só olhar para os bebês que aprendem a chorar antes mesmo de falar e usam esse mecanismo para suprir necessidades básicas como fome e para lidar com suas angústias. Com o tempo e o amadurecimento, vamos criando outros mecanismos para lidar com nossas dores e frustrações. Mas o choro segue sendo uma ferramenta muito importante e que foi renegada. As pessoas acham que se aprendeu a falar já não precisa mais chorar, mas isso não é verdade.

O choro é uma forma muito importante de elaboração das emoções, é uma ponte eficaz entre inconsciente e consciente. Às vezes choramos sem nem saber o motivo, ou seja, ainda não é possível elaborar aquele sentimento com o pensamento ou com a fala e chorar é a única solução possível de aliviar a tensão emocional. Mas desde muito cedo nos passam a ideia de que chorar é sinal de fraqueza. O famoso “engole esse choro” mostra para a criança que isso é errado ou vergonhoso – principalmente para os meninos. E a partir daí, vamos criando estratégias para reprimir essa forma importante, instintiva e natural de expressão humana.

O grande problema é que, ao reprimir uma emoção, ela não deixa de existir. Se não choramos, nosso corpo vai procurar uma nova forma de expressar aquilo que está sendo sentido – conscientemente ou não. E, muitas vezes, aquela emoção que não foi expressada com lágrimas, pode virar uma dor de garganta, uma dor de estômago e outras tantas somatizações possíveis mais complexas e dolorosas.

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Ativista do choro

Recentemente, li uma entrevista da escritora Cris Guerra em que ela se define como ativista do choro – e eu adorei este termo! Ela está lançando um livro infantil O Menino que Engoliu o Choro e falou sobre como precisamos levar o choro a sério. Eu concordo totalmente com essa afirmação. Precisamos legitimar o choro como forma de genuína de sentir.

Hoje vejo muitos amigos e amigas que são pais e mães buscando corrigir essa repressão ao choro tendo uma postura de mais acolhimento e trazendo para as crianças ferramentas que as ajudem a expressar todo tipo de emoção. Ou seja, eles tentam dar aos filhos aquilo que não tiveram na infância. Mas o que estamos fazendo por nós, adultos? Por que seguimos reprimindo ou tendo vergonha do nosso choro?

Sinto que, principalmente, porque chorar nos leva para um lugar de vulnerabilidade – e as pessoas têm muito medo de se mostrar vulneráveis, especialmente em público. Chorar é transbordar algo, é revelar algo íntimo, é quase uma nudez. É expressar de forma involuntária sentimentos profundos num mundo em que o código de normalidade é ser racional e superficial.

E como lidar melhor com o choro?

Como uma “chorona profissional”, digo que quanto mais eu choro, mais eu crio intimidade com as minhas lágrimas. Se você só reprimir as suas lágrimas, você não vai aprender a lidar com elas nunca. Hoje eu percebo a vontade de chorar chegando, aumentando…. como uma onda do mar que nasce marola, cresce até o momento de estourar, sabe? Eu sinto cada etapa desse processo acontecendo dentro de mim. Consigo me preparar, acolher, respirar e, muitas vezes, consigo até falar e chorar ao mesmo tempo com uma certa tranquilidade. Entendi que aquilo é parte natural da expressão dos meus sentimentos.

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Eu sinto também que quando eu me permito chorar eu estou me respeitando – e não estou mais tentando me encaixar num modo de pensar que confunde ser racional com ser forte. Na verdade, é mais corajoso chorar do que segurar as lágrimas.

Mas só consegui chegar neste lugar porque deixei minhas lágrimas rolarem livremente. Porque quando a gente reprime totalmente o choro, aquela vontade só vai ficando mais forte. E aí temos a impressão de que se a gente liberar vai ser sempre um acontecimento catártico e catastrófico, mas não é assim.

As lágrimas são águas carregadas de emoções. Não podemos nunca controlá-las. Mas se deixamos ela correr livremente, ela flui. Se bloqueamos a sua passagem,  ela vai represando e pode sair em forma de avalanche quando não conseguirmos mais segurar.

Sou Debora Pivotto, jornalista, escritora e terapeuta. Trabalhei por 13 anos em grandes redações do país até descobrir que os assuntos que mais me interessavam estavam dentro – e não fora – das pessoas. Apaixonada por autoconhecimento e comunicação, faço uma espécie de “reportagem da alma” com a terapia de Leitura de Aura, ajudo as pessoas a reconhecer e manifestar os seus dons e talentos facilitando um processo de autoconhecimento chamado Jornada do Propósito, e estou me especializando em Psicologia Análitica Junguiana. Adoro compartilhar meus aprendizados em textos, vídeos e workshops. Para saber mais, me acompanhe pelo instagram @deborapivotto.  

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