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Treino 3D - Corpo, Mente e Espírito, com Samorai

Bacharel em esporte, Samorai (@samorai3d) é criador do método de treinamento 3dimensional para reabilitação, prevenção e tratamento de lesões e performance. Aqui, auxilia praticantes e treinadores na busca por harmonia.
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A simplicidade é o ultimo estágio da sofisticação

Por Samorai
Atualizado em 13 jul 2021, 21h05 - Publicado em 13 jul 2021, 20h07

Todos já ouviram falar da fórmula da teoria da relatividade, o E=mc². Seguramente, assim como eu, quase ninguém sabe o que isso quer dizer, no entanto sabemos que por ela Einstein foi alçado à categoria dos gênios da humanidade. Mas tem uma coisa muito fácil de entender dessa fórmula. Tão fácil que até eu entendo. Essa é a menor fórmula da física. A que contém menos elementos. Isso porque ele acreditava que nada que é muito complexo pode estar 100% correto. Se para explicar você precisa dificultar é porque você não entendeu bem do que está falando.

Esse fim de semana estive em Novo Hamburgo ministrando um workshop de treinamento 3Dimensional e na primeira parte dele abordamos a filosofia 3D. O primeiro pilar dessa filosofia é a simplicidade. O segundo é o processo de aprendizagem, que na nossa visão seria algo diferente de processo de ensino. A diferença entre ambos é que no primeiro o valor está na maneira como o outro aprende e no segundo, como eu ensino. Parece uma diferença sutil, porém serve para me lembrar que a forma que tenho que transmitir conhecimento tem que ser de acordo com a forma que meu aluno aprende, e se ele não entendeu, tenho que criar outra forma, outro exemplo, outra comunicação até que isso aconteça. Isso realmente é um valor na nossa comunidade 3D.

E isso tem a ver com a crença do Einstein sobre coisas complexas. Se sua explicação está complexa é porque você não entendeu. Fui a muitos congressos e workshops nos quais os palestrantes falavam muito difícil. Usavam termos altamente técnicos, exemplos muito abstratos, estratégias complicadas e teorias que mais confundem do que explicam. E eu percebia que a maioria na plateia fazia cara de conteúdo, fingia que entendia, não perguntava para não se expor, e saía do workshop com duas sensações. A primeira que não sabia nada e a segunda que o palestrante sabia muito. Bom, além do Einstein, outro gênio que me inspira é Sócrates. E a frase célebre dele é “só sei que nada sei”. Sendo assim, se no meu workshop a plateia sair com a impressão que sei muito, e pior, se eles não aprendem nada, seguramente foi um fracasso. E para isso a comunicação simples e autêntica é fundamental, mesmo que, uma vez em uma aula na USP, um professor tenha dito que um profissional jamais deve usar termos como “batata da perna” ou “esticar o braço”. Para mim, o simples é melhor. Se precisar, vou usar sem dó.

Uma das estratégias que aplico, tanto nos workshops como para os clientes da minha academia, são as analogias. Nada pode ser mais poderoso do que elas para que meus clientes entendam sobre o que quero dizer. E sim, é muito importante que meus clientes entendam o meu processo de pensamento, porque não sou um passador de exercícios. Sou alguém que te dá a mão para que você realize a sua jornada. Sou um facilitador, um servidor. Então a jornada é sua, logo, você é responsável por ela e para isso você tem que entender meu pensamento para que eu possa te ajudar. Porque eu posso até entender bem de movimento, mas não entendo nada de você. E como a trajetória é sua, você é o elemento fundamental. E hoje, vou abordar algumas das analogias que faço para que você, profissional da área, consiga entender e explicar para seu cliente, ou para você, que não trabalha com isso, entender seu próprio corpo e possa entendê-lo ainda melhor.

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ANALOGIA DA ORQUESTRA SINFÔNICA

Na minha coluna da semana passada que você pode ler aqui, fiz uma analogia sobre o freio de mão de um carro para explicar sobre um sistema integrado e como uma parte afeta o todo. Mas posso explicar isso de outra forma por meio da orquestra sinfônica. Imagine seu corpo como uma orquestra na qual todas as partes têm uma tarefa a desempenhar individualmente e outra coletivamente e são regidas por um maestro. Nosso corpo também é assim, cada parte dele tem sua tarefa e sua função isoladamente, mas também compõe um sistema maior que tem sua tarefa global e é regido pelo seu maestro, que é o nosso cérebro.

Por exemplo, a tarefa do quadril é flexionar, estender, abduzir e aduzir, rodar interna e externamente. Contudo, essas tarefas não são isoladas e interagem com as tarefas do joelho, da coluna, do coração, das veias, dos proprioceptores e todos eles realizam uma caminhada, que para acontecer precisa haver uma coordenação do cérebro para que cada tarefa aconteça no momento e na magnitude correta. Pensando no corpo dessa forma, faria sentido cada músico treinar seu instrumento individualmente e nunca ensaiasse com a orquestra, mas na hora de se apresentar para plateia, também seriam apresentados uns aos outros e ao maestro, porque eles não se conhecem?

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Não seria melhor que eles se conhecessem antes, ensaiassem antes, funcionassem coletivamente muito bem e, desculpem mais uma analogia, como música? Colocando dessa forma fica fácil dar a resposta, não? Mas não é assim que a maioria das pessoas treina. Elas treinam de forma isolada, mas se movem de forma integrada. O que para mim não faz nenhum sentido. Na nossa analogia, elas ensaiam, cada uma na sua casa, mas se apresentam juntas tentando formar uma sinfonia. O problema aqui é que em uma orquestra o máximo que pode acontecer é a música ser ruim, no entanto no seu corpo podem ocorrer dores e lesões. Então se você está treinando isolado e se machuca ou sente dores, a causa pode estar na sua forma de treinar, principalmente se você praticar algum esporte, como o futebol, que não tem nenhum movimento isolado.

ANALOGIA DO VIOLÃO

Seguindo a mesma lógica, você pode estar pensando que mesmo treinando isolado, de alguma forma você está se aperfeiçoando e com isso terá um ganho de performance. Isoladamente você pode até estar correto, mas no coletivo, no movimento integrado, isso não é verdade, porque você pode até desenvolver força, mas se não souber controlar essa força ela pode ser um problema, como aconteceu com o Ronaldo Fenômeno quando o tendão patelar dele explodiu em campo.

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A perna dele era capaz de produzir muita potência, mas o tendão não era capaz de suportar essa potência naquela amplitude, naquela posição, naquele ambiente, com aqueles ângulos de movimento e vários outros fatores que não existem no treino isolado. Para explicar isso, uso a analogia de um violão. Se você afinar cada corda de um violão em um tom ou nota, você terá, isoladamente, por corda, todas afinadas, mas no todo um violão desafinado e uma música horrorosa, porque sistemas integrados devem conversar. Essa é a premissa básica. E para isso devem ser treinados em conjunto, ou na nossa analogia, uma corda deve ser afinada no mesmo tom da outra.

METÁFORA DA PALESTRA EM JAPONÊS

A minha maneira de fazer reabilitação é por meio do que está bom. Ou seja, se você tem um movimento que gera dor, vou começar a mexer onde não dói, onde o movimento é bom e vou gradativamente caminhando até o ponto da dor. Nesse caminho, vou desenvolvendo recursos em corpo, mente e espírito, e com isso possibilitando o corpo a melhorar sem ir diretamente na área do problema, pois como já vimos na coluna da semana passada citada acima, onde está a dor não está o problema.

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Outro ponto a se considerar é que onde dói é porque nesse movimento o corpo não possui recursos, porque se os tivessem ali não seria um ponto de dor. E quando pensamos em mente e espirito, um local com dor também tem interferências muito grandes destes elementos, porque a dor gera medo, trauma, desconforto e muitos fatores que não contribuem para um processo de reabilitação. Agora, quando abordamos movimentos sem dor, trazemos o emocional junto e quando formos adentrar a zona da dor, nosso lado emocional também está preparado.

Podemos caminhar por aqui já que entendemos o corpo como uma cadeia de reações e que está todo integrado. Porém, se pensarmos isolado isso não faz sentido, por isso todas as terapias tradicionais abordam diretamente o ponto da dor, aquele onde tem dor, medo, trauma, falta de recursos e querem que isso dê certo. Por isso recebo tantos clientes que já estão há anos pulando de terapias em terapias sem sucesso e em poucas sessões ficam ótimos. Porque caminhamos sempre cheios de recursos para enfrentar nossos “inimigos”.

Para você entender esse caminho, uso a analogia da palestra em japonês. Imagine que eu te pedisse hoje para fazer uma palestra em japonês. Provavelmente você se desesperaria porque não saberia nem por onde começar. Isso porque você não tem recursos. Aí está a sua dor. E se eu tentasse, na marra, que essa palestra saísse, muito provavelmente a experiência seria frustrante e é possível que nunca a teríamos. Agora vamos imaginar se eu te pedisse para primeiro criar uma palestra, em português mesmo (recurso), sobre um tema que você domine (recurso novamente) e que utilizasse apenas uma palavra em japonês. Ficou mais fácil, né? Você pode até pegar uma palestra que já tenha domínio (mais recurso ainda) e no final dizer “arigato”. Pronto. Você já cumpriu a primeira etapa e podemos dizer que foi fácil.

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Agora podemos pensar em pegar qualquer palavra que tenha na sua palestra, olhar em um dicionário e usá-la em japonês. Neste momento, você precisa praticar apenas uma palavra nova. O resto você já domina. Pode ser que essa palavra apareça mais vezes. Logo, uma parte da sua palestra já está tomando forma. Assim que você estiver confortável, você coloca mais uma palavra. Um dia você coloca um artigo e verá que ela aparece várias vezes, aumentando assim a quantidade de palavras em japonês na sua palestra. Enfim, um dia, sem traumas, essa palestra estará pronta, porque você usou seus recursos para gerar novos recursos, e a partir deles você gerou outros novos. E isso é exponencial. Por isso esse modelo, além de funcionalmente ser o único que faz sentido, é tão tranquilo e tão rápido e resolve problemas nos quais os outros não chegam.

ANALOGIA DO ZAGUEIRO QUE PENSA QUE É CRAQUE

Para terminar, um dos maiores problemas na reabilitação é quando o cliente não aceita sua condição e, para mostrar que pode mais, faz coisas que hoje não seriam boas de fazer, ao menos por enquanto. Conhecer sua condição é um recurso enorme na reabilitação. É tipo um zagueiro que sabe que é ruim. Ele chuta para onde está virado e você nunca vai tomar um gol porque ele tentou inventar. Já o zagueiro que acha que é craque, sempre terá um toquinho a mais na bola ou um drible em hora errada. Aí já viu, né…. Gol adversário.

Essas analogias facilitam o entendimento dos clientes e também o meu, pois fica mais fácil saber qual caminho trilhar. A simplicidade também pode estar em definições simples de coisas complexas, como as definições que criei para reabilitação, prover autonomia, ou avaliação, extrair informação. Parece bobagem, mas essas definições simples vão te salvar quando você estiver perdido. E não obriga ninguém a fazer cara de conteúdo na plateia dos workshops. Algumas pessoas pensam que se você for simples você será desvalorizado profissionalmente. Mas eu já penso diferente. Só pode ser simples quem sabe, porque ele passa a mensagem tão claramente que todos podem avaliar. E isso desmistificaria muito picareta por aí. No entanto, sobre isso prefiro acreditar em outro gênio da humanidade. Já que comecei por um, vou terminar por outro. Leonardo Da Vinci, que dizia que a simplicidade é o último estágio da sofisticação. Chique!

Forte abraço,

Samorai

 

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