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“Não admito que falem do meu corpo. Ninguém sabe o que eu passei ou passo”

Jorge Bentes, criador do "Cansei de Ser Gordo" eliminou 80 quilos em um ano após se dar conta que não conseguia caminhar por 20 minutos

Por Amanda Ventorin
Atualizado em 14 abr 2021, 15h41 - Publicado em 14 abr 2021, 09h00
Jorge Bentes levantando peso na academia
 (Jorge Bentes/Arquivo pessoal)
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“É prazeroso vencer a obesidade” Foi a frase que Jorge Bentes, de 39 anos usou em um dos seus últimos vídeos no canal “Cansei de ser Gordo” que criou em 2013, quando resolveu emagrecer.

Pesando 150 quilos, o jornalista (na época aos 31 anos) resolveu dar uma volta no Parque Vitória durante uma viagem de trabalho no Paraná, mas percebeu que não conseguia manter a atividade nem por 20 minutos. “Eu fiz uma conta rápida e cheguei a conclusão de que eu tinha pouquíssimo pouco tempo de vida. Eu tenho muita fé, não sou religioso, mas tenho muita fé e para mim, Deus falou comigo ali, porque podia ter passado despercebido. Tinha que ser naquele momento, naquele dia.” Jorge diz que chorou muito após chegar a essa conclusão e teve, também, a certeza de que conseguiria mudar sua vida.

Um ano depois, ele havia eliminado 80 quilos.

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O “sedentário de carteirinha”, como o mesmo se definia, não contou para ninguém sobre a decisão que havia tomado de emagrecer “Ninguém vai acreditar na sua força enquanto ela ainda está dentro de você. É preciso mostrar que ela está ali”.

Procurou apoio médico, indo a nutricionistas para começar seu processo de emagrecimento e uma semana depois, já havia eliminado dois quilos. “Eu chorei muito, foi como se eu tivesse conseguido eliminar tudo” Apesar do sentimento, Jorge enfrentou diversas dificuldades no começo do processo, sendo uma delas a fome, o que o fez criar mecanismos na sua cabeça para conseguir driblar a sensação e os desejos das comidas que não estavam inclusas no seu novo cardápio, ecolocando os prós e contras em uma balança mental. “Eu pensava: Já sei o sabor disso, agora eu quero conhecer o sabor de ser outra pessoa, de ter ter saúde. Assim, eu conseguia driblar essa fome”.

A atividade física também foi um desafio, principalmente pela vergonha de frequentar uma academia. Sem roupas de ginástica para seu tipo de corpo, Jorge fez as suas com uma costureira e começou aos poucos: caminhando 20 minutos por dia no Parque Vitória, aumentando gradativamente o tempo, até alcançar 40 minutos. “No primeiro mês, eu eliminei 12 quilos, mas você nem iria reparar. Ninguém notava.” Depois disso, tomou coragem para entrar na academia, mesmo se sentindo um “E.T” e experimentando dores grandes físicas e até mesmo febre. A constância foi a chave para seu sucesso, Jorge se exercitava todos os dias, se segunda a sexta “fazendo chuva ou sol”.

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Apesar de no começo da sua jornada não ter tido nenhum acompanhamento psicológico, ele diz que a terapia é um ponto essencial. “Comecei a terapia praticamente no fim do meu processo de emagrecimento, só que hoje eu percebo o quanto ela é importante desde o início. Em relação aos meus mecanismos mentais, eu descobri depois que são técnicas que já são usadas para pessoas que querem emagrecer.” Jorge procurou a terapia, na verdade, após perder muito peso na esperança de entender o que havia sobrado de si. “Eu não sabia quem eu era, olhava no espelho e via minha cabeça no corpo de outra pessoa. Eu chorava muito, foi uma experiência muito difícil. Precisei ressignificar aquela pessoa que havia ficado”, diz emocionado.

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A obesidade e o preconceito levaram muito de Jorge. A roupa que gostava, saber o que gostava e até mesmo o poder de dizer não. Durante toda sua vida, Jorge escutou que era sua culpa os problemas que enfrentava com seu peso. “Eu cresci ouvindo um livro muito famoso nos anos 80 que era Só é gordo quem quer. A gente vem de uma cultura que julga, aponta e ridiculariza e que culpa o gordo por sua doença, então acabamos relacionando a comida a culpa. E é por isso que muitas vezes que comemos, sentimos isso. E é devastador na cabeça de uma pessoa.”

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Seu corpo nunca foi magro, sempre considerado fora do padrão, ele viveu uma vida buscando um estilo mais saudável “Tenho memória com dez anos fazendo dieta. Sempre fui efeito sanfona, emagrecia e engordava, tem fases minhas muito gordo e outras mais magro, sempre lutei contra isso, mas não tinha muita consciência de como tinha hoje em dia. De que a obesidade é uma doença e que a gente precisa de uma equipe (de médicos) pra ajudar.”

Durante um tempo, o jornalista aceitou seu corpo sendo muito feliz, “O nome do projeto se chama Cansei de Ser Gordo, porque por um tempo, eu me aceitei gordo, eu era feliz. Só que eu cansei, queria brincar de ser outra coisa.” Apesar do amor que sentia por si, e por esse ter sido o combustível que o levou em direção a mudança, haviam traumas e limitações que Jorge havia se colocado durante toda sua vida, por conta do tamanho do seu corpo, se permitindo de certas experiências aos 31 anos, após emagrecer, como o simples ato de usar uma regata.

Cansei de ser gordo

O blog, na verdade, surgiu antes do emagrecimento de Jorge. Analisando os conteúdos de emagrecimento que encontravam na internet, tudo parecia muito irreal e complicado de se seguir “Coma chia, quinoa… Essa não era muito a realidade. Eu queria fazer algo ‘politicamente incorreto’, pois eu acho que só um gordo pode falar para um gordo sobre a realidade” O projeto foi aprovado no portal que o jornalista trabalhava na época, mas seria publicado apenas após 50 quilos perdidos. Em suas postagens, ele é direto e não tem nenhuma papa na língua, ao mesmo tempo em que acolhe e dá apoio a todos seus seguidores que buscam uma vida mais saudável e ativa, que é o que o faz ser tão popular nas redes com mais de 119 mil inscritos no seu canal. “Não quero que meus seguidores me vejam como super herói, eu erro, eu caio, eu engordo e emagreço.”

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Ele fala abertamente sobre como está em uma posição difícil, principalmente devido a pandemia do novo coronavírus, onde uma semana parece um mês e os hábitos saudáveis podem se tornar mais difíceis de manter “principalmente para a gente que procura afago na comida. Nós temos uma relação diferente com os alimentos: quando vemos uma notícia triste, só queremos uma barra de chocolate.” Para ajudar a tirar a pressão dos ombros de seguir uma dieta e rotina de exercícios durante a semana, Jorge lançou em sua página do instagram o #DesafioSóPorHoje, que começou por si mesmo “Eu falava: Gente, eu não vou aguentar voltar para minha alimentação saudável porque eu estou em um buraco e eu vou começar a fazer só por hoje. Hoje eu vou fazer atividade física, amanhã eu não sei, mas só por hoje eu vou.” E assim, com o tempo, Jorge viu que tudo se tornou mais leve, lançando a ideia na sua rede, obtendo uma resposta muito positiva.

Quando perguntado sobre a flacidez, consequência muito comum da perda de peso, Jorge fala que essas foram as marcas menos importantes que ficaram em sua vida. Não tem planos de fazer cirurgias plásticas, e diz que não as faria por estética. “Se um dia eu fizer, é por mim. Não é por padrão, é para o meu bem estar”. Ele acredita que o corpo certo é aquele que dá pra se sustentar. “Eu tenho quatro corpos, o que eu era muito gordo, o que eu fiquei muito magro, que eu fiquei sarado e o que dá para manter. Não é aquele super magro, que não era eu, ou o super bombado que tinha que andar com lancheira para onde ia.”

 

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E revela que, o segredo para seu sucesso sempre foi a força do hábito, por mais difícil que seja construir. De um “sedentário que odiava se mover”, hoje em dia Jorge não se sente bem, mentalmente, nos dias que não se exercita. “Todo dia eu me obrigada a me mover. Saía de casa com a roupa de academia e ia sem vontade mesmo, porque o hábito se constrói com a disciplina da rotina.” Ele escolhia vencer a preguiça e o extinto natural de não se exercitar. Mesmo hoje em dia, sendo acostumado com essa rotina, ele precisa ficar em alerta. Foram 31 anos que o seu cérebro pilotando em uma direção, e nos últimos 8 anos, ele vem se movendo na contramão.  “Eu não admito que falem de mim ou do meu corpo. Ninguém sabe o que eu passei ou o que eu passo.”

Jorge conta que sua motivação é seu amor-próprio e a consciência de que ele não tem o direito de parar “Eu maltratei o meu corpo por muito tempo. Eu vou estar com 60, 70 anos no cansei de ser gordo, essa é minha missão de vida e eu tive que chegar aos 150 quilos para descobrir isso e falar com as pessoas que passam pelo mesmo problema que eu passo sobre amor. Demorei para perceber que o projeto não era sobre dieta, mas sim sobre amor. Eu recebi um presente de Deus que não posso guardar comigo.”

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