Diariamente, somos expostos a inúmeras substâncias consideradas tóxicas para nós — e não estamos falando apenas de poluição. As toxinas que vêm de dentro pra fora são, talvez, ainda mais importantes. Estamos falando do que ingerimos: alimentos industrializados e ultraprocessados repletos de açúcares, gorduras, conservantes, corantes, adoçantes e agrotóxicos. Pois é. Todos esses itens podem desregular os hormônios e aumentar a produção de radicais livres, o que favorece o envelhecimento precoce das nossas células e causa diversas sobrecargas no corpo, como o aparecimento de doenças crônico-degenerativas (diabetes, hipertensão, Alzheimer e até câncer). É por isso que é tão comum ouvir sobre “dieta detox.” Mas será que ela funciona?
A verdade é que, em teoria, o organismo humano, por si só, já é capaz de eliminar as toxinas. Afinal, órgãos como fígado e rins exercem o papel de filtrar e mandar para fora as substâncias indesejadas. “As toxinas chegam primeiro no intestino, podendo gerar a diarreia como a primeira forma de eliminação ‘de emergência’. Já as que conseguem passar da barreira do intestino entram na corrente sanguínea e vão para o fígado, que as manda de volta para serem descartadas nas fezes. Mas se elas também conseguirem driblar o fígado, acabam parando nos rins, onde serão excretadas através da urina”, afirma a nutricionista Débora Palos, da Clínica Dra. Maria Fernanda Barca (@dra.mariafernandabarca), em São Paulo.
Órgãos como intestino, fígado e rins exercem o papel de filtrar e mandar para fora as substâncias indesejadas naturalmente
O problema é que o nosso estilo de vida atual é tão desequilibrado que, muitas vezes, o corpo não dá conta de realizar o processo sozinho. É por isso que muita gente fala em dar uma mãozinha para ele com a dieta detox.
O que é a dieta detox
Como o próprio nome revela, a dieta detox consiste em um protocolo alimentar que visa promover a desintoxicação do corpo. “Pode ser dividido em três fases de 10 dias, ou uma única fase de 21. Ou ainda durar períodos mais curtos, de três a sete dias”, explica a nutricionista Priscilla Benigno (@priscillabenigno), do Rio de Janeiro.
O tempo costuma ser curtinho assim porque o cardápio proíbe diversos alimentos, o que acaba levando a uma restrição calórica (e muitas vezes de nutrientes) significativa. “Ficam de fora ultraprocessados e industrializados, refrigerantes, bebidas alcoólicas, frituras, açúcar, sódio e gordura. Carne vermelha, frango e peixe entram, mas em poucas quantidades e em cardápios mais longos”, diz a especialista. Leite de vaca, seus derivados e alimentos ricos em glúten (como pão e macarrão) também não podem ser consumidos.
A dieta detox acaba levando a uma restrição calórica (e muitas vezes nutricional) significativa
Por outro lado, prioriza-se ingredientes frescos e mais naturais. “Encontramos dentro de uma dieta como essa frutas, legumes e verduras ricos em antioxidantes, vitamina A, C, zinco, magnésio, entre outros”, explica Débora Palos.
Os poréns
Até aí, tudo parece perfeito, né: mais alimentos in natura e menos industrializados = uma alimentação equilibrada. Contudo, algumas características colocam a dieta detox na lista dos protocolos um tanto quanto controversos. A primeira é o fato de que a ciência ainda não entrou em total concordância sobre ela.
A cartilha “Desmistificando Dúvidas Sobre Alimentação e Nutrição”, produzida pelo Ministério da Saúde em parceria com a Universidade de Minas Gerais (2016), argumenta que há evidências de que alguns alimentos (coentro, maçã, uvas e vinho) podem sim ser úteis para a eliminação de metais tóxicos do nosso corpo.
Ainda não é conhecido o efeito de alimentos com propriedades detox em estudos científicos
Mas somente de metais tóxicos. “Entretanto, ainda não é conhecido o efeito de alimentos com propriedades detox em estudos científicos. Os grandes benefícios obtidos pela dieta detox fundamentam-se na presença de alimentos in natura, como frutas e hortaliças, e aqueles minimamente processados”, diz a cartilha.
E aí entra o outro problema. O uso comercial do termo detox é atualmente feito por muitas empresas para vender sucos, chás e shots “milagrosos”. “Isso não quer dizer que um ‘suco detox’, por exemplo, faça mal para o organismo. Mas é complicado defender que ele ajuda a desintoxicar. O que acontece é que depois de um dia de excessos, por exemplo, esse líquido (rico em fibras, nutrientes e antioxidantes) pode auxiliar o funcionamento do intestino e garantir mais energia, dando a sensação de termos eliminado muitas toxinas”, explica o nutrólogo Fernando Cerqueira (@drfernando_cerqueira), de São Paulo.
“Os produtos contendo as expressões ‘DETOX’ podem causar erro e confusão ao consumidor, pois trazem a ideia de que possuem funções de ‘desintoxicação’ do organismo, o que não é comprovado cientificamente. Em 2015, a Anvisa suspendeu a veiculação de 21 produtos detox.”
Em 2015, a Anvisa suspendeu a veiculação de 21 produtos “detox” por uso indevido do termo
A publicidade apelativa, somada à falta de acompanhamento médico e desinformação aumentam as chances de fazermos escolhas erradas. Como, por exemplo, se entupir de preparos à base de couve só porque a internet fala que é bom. “Tudo em excesso traz problemas. A couve é um alimento rico em clorofila, que atua no combate às toxinas e é muito rico em vitaminas e antioxidantes. Mas consumir apenas isso faz mal, porque ela não tem todos os nutrientes que nosso corpo precisa”, alerta Priscilla Benigno.
Outra aplicação indevida dessa ideia está em usar a dieta detox para perda de peso. “Ela realmente pode ajudar a emagrecer, uma vez que acentua o processo de eliminação de líquidos, ou seja, desincha e diminui a retenção”, afirma a nutricionista. Porém, como todo cardápio restritivo, jamais deve ser feita por muito tempo, e não serve para todo mundo. Pacientes com histórico de compulsão alimentar e/ou deficiências nutricionais não devem começar nada sem consultar um especialista antes.
Por fim, não custa lembrar: o protocolo não cura doenças e muito menos previne infecções alimentares, tá? “Ele não é um remédio. Apenas ajuda a metabolizar as toxinas que estão em excesso”, explica Débora Palos.
Limpeza interna no dia a dia
Pedras no rim, gordura no fígado e colesterol alto consistem em alguns dos sinais de que seu organismo precisa de uma forcinha para a excreção das substâncias indesejadas. Mas não quer dizer que você tenha que adotar a dieta detox para ontem. Vale mais apostar em hábitos que contribuem no funcionamento do corpo. Quem elenca cada um deles é a nutróloga Ana Luisa Vilela (@draanaluisavilela), de São Paulo:
1. Água sempre!
“O líquido força o rim a colocar excretas para fora mais rapidamente. Veja a ureia, fruto do nosso metabolismo. Em grandes quantidades, ela é tóxica e pode afetar o cérebro e causar insuficiência renal, o rim ajuda a manter os níveis dela adequados no corpo”, diz a especialista.
Potencializar a função de filtragem do órgão ingerindo mais água também equilibra os níveis de sal no sangue e de cálcio, formador dos cálculos. “Ter muito do mineral em circulação significa que o corpo está tirando das reservas naturais (ossos) para jogar na corrente sanguínea.”
Sem contar que, quando combinada com uma boa ingestão de fibras (vindas do consumo de frutas, verduras e legumes in natura), a água emulsifica as fezes e melhora o trânsito intestinal. Por isso, o ideal é beber diariamente a quantidade indicada para seu peso corporal (aprenda a calcular aqui).
2. Evite exagerar nos ultraprocessados, açúcar e gordura
Todos eles exigem que o nosso fígado produza muita bile para facilitar a digestão. “Ela é como um ‘detergente’: quebra as moléculas de gordura e ‘lava’ o intestino. Quando comemos alimentos cheios de açúcar, provocamos picos de glicemia no sangue, que são transformados em gordura e estocados no corpo. Isso sobrecarrega o órgão.”
3. Pratique esportes!
Seu coração fica mais forte. E consegue bombear o sangue pelo corpo com mais eficiência. “É o líquido vermelho que promove as trocas gasosas com as células e transporta tudo o que a gente não usa para os órgãos excretores”, diz a nutróloga.
4. Durma bem
Durante o sono, muitos processos de limpeza acontecem a todo vapor como a renovação da pele, eliminação de informações inúteis pelo cérebro, funcionamento do intestino e excreção de diversas toxinas. Por esse motivo, você se sente tão revigorado depois de uma boa noite de sono: o organismo naturalmente se renova! Veja como ter uma boa noite de sono aqui.
Essa matéria faz parte da edição de dezembro de Boa Forma que tem como tema Detox e traz especiais sobre como fazer uma limpeza em diferentes áreas da vida. Clique aqui para ver os outros especiais da edição.