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Espiritualidade prática, com Debora Pivotto

Espiritualidade e autoconhecimento conectados com a nossa saúde física e mental, com o coletivo e com a vida prática
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BBB e o entretenimento com a saúde mental 

Por Debora Pivotto
Atualizado em 5 mar 2024, 17h04 - Publicado em 4 mar 2024, 17h10

A jovem Vanessa Lopes deu uma entrevista ao Fantástico recentemente falando sobre como está se cuidando e como vem se sentindo desde que saiu do Big Brother Brasil 2024. Para quem não se lembra, no dia 19 de janeiro, a jovem de 22 anos apertou o botão da desistência depois de viver dias de muito sofrimento dentro da casa, em que ela alternava entre crises de choro, dúvidas e conversas que mostravam que ela estava vivendo numa realidade paralela, acreditando que todos os participantes do jogo eram atores e que havia uma grande estratégia do programa para tentar fazê-la enlouquecer, entre outros devaneios.

Apesar da tristeza dos colegas de reality e de parte da sua torcida, a saída da jovem foi um grande alívio. Era absolutamente angustiante ver uma pessoa em meio a uma crise de saúde mental tão grave continuar sendo exposta daquela maneira. 

Vanessa começou o jogo muito bem, parecia determinada, com estratégias e boas chances de protagonismo. Mas com o passar dos dias, seu comportamento se transformou na medida em que a tensão do jogo – e dentro dela – foi aumentando. O medo de ter uma visão equivocada dos fatos e de ser criticada e cancelada pelo público fizeram com que a jovem, que tem cerca de 40 milhões de seguidores nas redes sociais, entrasse em profundo sofrimento.

As crises de choro foram ficando cada vez mais frequentes e as teorias da conspiração, que no início eram vistas como viagens  engraçadas, começaram a preocupar as pessoas dentro e fora da casa. Nas redes sociais, muita gente começou a pedir intervenção da produção e da família, mas as respostas eram sempre de que ela estava sendo bem monitorada e que tudo estava dentro da normalidade. O pai de Vanessa chegou a fazer um vídeo tranquilizando os fãs, dizendo que ela estava sob acompanhamento da equipe especializada do programa e que haveria alguma intervenção se necessário. 

Dentro do programa, alguns participantes também se preocuparam com Vanessa e tentaram ajudá-la. Deniziane, que chegou a chorar ao ver a colega falando coisas desconexas, falou para Matteus que achava que a produção deveria intervir porque aquilo não parecia “normal”.  E levou bronca da direção do programa por conta disso. 

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Os dias foram passando, e a crise de Vanessa só se agravou. Mas, novamente, a direção do programa dizia que ela estava sendo bem monitorada. No dia 18 de janeiro, o apresentador Tadeu Schimidt, antes de mostrar um VT sobre o dia da jovem na casa falou que “a nossa equipe segue acompanhando tudo bem de perto. Agora pouco a gente voltou a conversar com a Vanessa e a ela segue no jogo. Mas o dia foi difícil pra ela”. 

Até que o que já estava “difícil”, ficou insuportável. No dia seguinte, depois de falar mais uma teoria da conspiração para os colegas, Vanessa apertou o botão de desistência e saiu do programa. 

Fim da angústia, início do tratamento

Fora do programa, Vanessa entrou em total reclusão. Não participou de nenhum dos eventos e entrevistas que são rotina de todos os eliminados do jogo e também não fez nenhum pronunciamento nas redes sociais, onde antes compartilhava sua rotina diária. 

Na entrevista ao Fantástico, o pai da jovem quase chorou ao lembrar do estado crítico de confusão mental em que a filha estava quando eles se falam por telefone assim que ela saiu do programa. A mãe disse que, no aeroporto, a menina desabou a chorar e parecia ter dúvidas se os pais eram mesmo pessoas reais. 

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Percebendo a gravidade da situação, Vanessa finalmente foi levada a um psiquiatra, que a diagnosticou com um quadro psicótico agudo, que como ela mesma explicou ao Fantástico, é como se a mente dela tivesse rompido totalmente com a realidade. A jovem agora, com o apoio da família, equipe médica e amigos, tenta se recuperar em casa, bem longe das telas e das redes sociais. 

O que aconteceu com a Vanessa dentro do programa foi muito grave. Não foi uma crise de estresse qualquer, que passou rapidamente assim que ela saiu do jogo. Pelo contrário, é algo que deve levar bastante tempo para que ela consiga elaborar e se recuperar. E confesso que fica difícil entender como que, mesmo nesta situação, nada foi feito para impedir que aquele suplício continuasse – Vanessa saiu quando ela mesma não aguentou mais e desistiu.

Ou seja, apesar de seu sofrimento ter sido vigiado e televisionado o tempo todo, foi somente do lado de fora da casa que todos puderam ter a dimensão da gravidade do que ela estava passando – ou quando todos quiseram enxergar o que realmente estava acontecendo. 

Num reality como o Big Brother, é esperado ver os jogadores sofrendo com a pressão do jogo, problemas de relacionamento e angústia do confinamento. Ver como as pessoas reagem a esses perrengues é a grande “graça” do jogo. Mas a história da Vanessa nos obriga a refletir sobre qual é o limite deste tipo de entretenimento. Até que ponto ver uma pessoa com a saúde mental abalada é divertido ou aceitável? Quando a crise emocional vira patológica? Quanto de sofrimento deve ser televisionado? Quais os critérios médicos, jurídicos e morais que definem uma possível intervenção diante de uma situação como essa?

O caso da Vanessa mostrou que ainda falta muita discussão, informação e bom senso para este tipo de situação. A produção do programa, que vem se mostrando muito atenta a posturas inadequadas e comportamentos abusivos quando o assunto é racismo, homofobia e machismo, ainda tem muito o que evoluir quando o assunto é saúde mental.

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