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Transtorno do comer compulsivo: o que é e como evitar

Cerca de 5% da população sobre dessa doença, também conhecida como compulsão alimentar

Por Amanda Ventorin
Atualizado em 11 out 2023, 18h25 - Publicado em 12 Maio 2021, 09h00

Comer até se sentir estufado, sentir vergonha ou culpa após se alimentar, fazer dietas rígidas e logo em seguida comer grandes refeições em pequenos períodos de espaço… Tudo isso pode ser um sinal de compulsão alimentar. Essa doença tem sofrido uma evolução na sua classificação ao longo do tempo, ganhando o nome de transtorno do comer compulsivo, definido a partir do manual classificatório de doenças no dsm-5 e é o  transtorno alimentar mais frequente. “Cerca de 5% da população, sendo 2% nos homens 3% mulheres, em geral adultos jovens em torno de 20 anos. Porém adolescentes, cerca de 1,7% apresentam o transtorno. Menos da metade (em torno de 43,6%) das pessoas com o transtorno do comer compulsivo recebem tratamento adequado ao analisar os dados norte americanos. Isso entre os brasileiros é menos ainda”, conta o Dr. Luiz Scocca, psquiatra. Uma pesquisa realizada pela Faculdade de Saúde Pública da USP, que entrevistou 1.167 alunos de escolas técnicas, constatou que 10,3% deles sofrem de compulsão. 

O que é Transtorno do comer compulsivo (compulsão alimentar)?

O transtorno do comer compulsivo se dá com a ação recorrente de comer de modo descontrolado, em um curto espaço de tempo e com uma quantidade maior que o organismo consegue absorver. Os transtornos alimentares afetam de forma negativa a vida da pessoa e envolvem uma perturbação da alimentação ou do comportamento relacionado à alimentação, que costumam incluir também: Alterações dos alimentos ou da quantidade consumida pela pessoa e medidas que as pessoas adotam para evitar que os alimentos sejam absorvidos pelo corpo (por exemplo, autoinduzindo o vômito ou tomando laxantes) e é muito comum sentimentos como culpa e arrependimento acompanharem esse hábito. Para que um comportamento alimentar incomum seja considerado um transtorno, o comportamento precisa continuar por um determinado período e causar prejuízo significativo à saúde física da pessoa e/ou à capacidade de desempenhar funções na escola ou no trabalho ou afetar negativamente as interações da pessoa com outros. As mulheres, principalmente na adolescência e no começo da vida adulta, tendem a apresentar um maior risco de desenvolver esse distúrbio.

Várias configurações podem desencadear uma compulsão como, por exemplo, ansiedade, depressão e doenças ligadas ao emocional. “Os motivos podem estar associados a fatores externos como estresse, uma briga na família, o trabalho, falta de atividade física, a própria pandemia, e por mais que a pessoa não consiga identificar, até mesmo crises de ansiedade e crises de síndrome do pânico podem estar associadas”, conta a Dr. Gabriela Cilla, nutricionista.

“Os transtornos alimentares tem causas psíquicas, fisiológicas, culturais e devem ser olhado de forma multidisciplinar. Pessoas que sofrem com transtornos alimentares estão passando por um momento muito difícil. Isso porque não somente estão infelizes com aspectos físicos do corpo, mas também tem o emocional abalado por tudo isso. Ou seja, são muitos sentimentos ao mesmo tempo. Entre eles estão proibições, culpas e medos. Esses sentimentos podem estar ligados à depressão, diminuição da autoestima, ansiedade e outros”, completa a psicóloga Paula Dutra.

Como identificar o transtorno?

Há diversos sinais para ficar de olho. “Comer e logo em seguida sentir culpa ou tristeza, fazer refeições a todo momento e em quantidades exageradas, constrangimento ao comer na frente de outras pessoas, alimentar-se rapidamente, fazer dietas rígidas e depois de um tempo comer compulsivamente, problemas emocionais (depressão e ansiedade), sentir repulsa do próprio corpo e evitar de olhar a própria imagem no espelho ou em algum reflexo são sinais de alertas para voltar atenção para os cuidados com a saúde física e mental, evitando que haja o desenvolvimento e agravamentos dos distúrbios alimentares” alerta Gustavo Patury, médico especialista em aparelho digestivo.

A origem do transtorno do comer compulsivo ainda se mantém indefinida. Luiz Scocca explica que há estudos que indicam que possa vir a ser um problema genético. “A causa do transtorno do comer compulsivo não está muito clara para para nós, é desconhecida mas temos muitas pistas de que o fator mais provável é o genético. Sabemos que a chance de se ter um transtorno de comer compulsivo é muito maior se na família houver, particularmente entre os pais, algum transtorno dessa esfera alimentar como bulimia, anorexia ou outros transtornos alimentares”, explica o profissional. Além disso, Rogério Oliveira, nutricionista, adiciona que aspectos ambientais e emocionais podem influenciar no desenvolvimento da doença. “A prática de dietas rígidas e restritivas demais e a obsessão com a própria imagem têm sido também algumas das causas que desencadeiam a compulsão alimentar”. 

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Quais as consequências da compulsão alimentar?

A compulsão alimentar pode gerar doenças graves como, por exemplo, diabetes, hipertensão, obesidade, doenças cardiovasculares e no sistema gástrico. “As consequências também incluem ganho de peso e estufamento, porque a pessoa que come demais fica com a respiração mais curta, e os órgãos digestivos ficam distendidos por causa do excesso de comida e acabam passando muito mal depois de uma crise”, diz a psicólogaFabiana Fuchs.

Há também níveis de gravidade quando estamos falando sobre a doença. “Na psicologia, vemos as patologias como leve, moderado e grave. No caso da compulsão, isso também se aplica. Leve seria ter poucas crises durante a semana. Moderado, quando tem mais de duas a três crises na semana e grave quando passa dessa quantidade”, explica Fabiana. 

Além da possibilidade de doenças, a compulsão alimentar pode acabar sendo interligada com transtornos alimentares mais graves como a bulimia (Induzir o vomito após comer, fazer uso de laxantes em excesso) e anorexia (se recusar a comer, contar as calorias consumidas se exercitando em excesso para queimá-las). “Caso a pessoa apresente a compulsão, as chances de desenvolvimento dos outros dois distúrbios são grandes, afinal todas essas doenças estão associadas a transtornos psiquiátricos e com a relação do paciente com a comida e a própria imagem”, alerta Rogério Oliveira.

Qual a forma de tratamento?

A psicóloga Paula Dutra explica que o tratamento é multidisciplinar e envolve terapia psicológica, nutricionista e equipe médica. “É fundamental que se busque ajuda, pois sozinho é muito difícil conseguir sair desse looping perigoso e muitas vezes fatal. Procure ajuda especializada”, reafirma a especialista.
E mesmo que uma vez em tratamento ou curado, o paciente deve estar sempre em alerta pois a compulsão alimentar, por muitas vezes estar ligada ao fator emocional (ou possivelmente genético), pode retornar. “Uma pessoa pode desenvolver novamente a doença. É preciso que ela fique sempre em vigília, pois qualquer acontecimento pode acarretar na volta das crises de compulsão. Sempre que houver um desequilíbrio emocional, a pessoa que tem tendência a compulsão pode ter recaída. A compulsão só muda o fator, mas é sempre o mesmo processo. Ela pode ter aprendido a lidar com a compulsão, mas se relaxar e não souber lidar com seus conflitos e ter velhos hábitos, ela pode voltar a ter compulsão”, explica Fabiana.

Ter uma rede de apoio foi muito importante para tomar a decisão de procurar ajuda médica, já que é bastante comum pessoas ao nosso redor muitas vezes não perceberem o que está acontecendo e que esses distúrbios realmente existem”

Glenda Barreto, influenciadora digital
A influenciadora digital Glenda Barreto sofreu de distúrbios alimentares aos 26 anos, após o nascimento de sua terceira filha. “Eu já estava mais magra do que em minhas primeiras gestações e lembro que calculava as calorias do que eu comia e ia para academia gastá-las. A partir daí, as coisas foram evoluindo: aos finais de semana, quando eu teoricamente não fazia exercícios físicos, comia e depois vinha uma culpa gigante diante do ato”, conta a influenciadora “Meu pai foi o primeiro a me ajudar com a questão do distúrbio alimentar e me apresentou profissionais especializados no assunto. Meu marido teve muita sensibilidade de entender pelo que eu estava passando e me incentivou muito a buscar ajuda, já que foi por meio de um alerta dele que vi que precisava me curar. Ter uma rede de apoio foi muito importante para tomar a decisão de procurar ajuda médica, já que é bastante comum pessoas ao nosso redor muitas vezes não perceberem o que está acontecendo e que esses distúrbios realmente existem”
Glenda Barreto
Glenda Barreto, influenciadora digital, já sofreu de distúrbios alimentares (Glenda Barreto/Reprodução Instagram)

 

Como prevenir?

Apesar dos indícios de poder vir a ser uma doença genética, um estilo de vida equilibrado e o autoconhecimento podem ser a chave para evitar o desenvolvimento do transtorno do comer compulsivo. “A prevenção acontece através do auto-conhecimento, cuidando do emocional e tendo uma boa relação com a comida. Ter uma rotina alimentar saudável e praticar atividades físicas também ajuda muito no que diz respeito à prevenção. Isso tudo vai ajudar a manter uma saúde alimentar e mental boa. A compulsão acontece por causa de um desequilíbrio, na tentativa de preencher um vazio existencial. E quando esse vazio é preenchido de dentro para a fora, a pessoa não vai mais descontar essa falta na comida. Se a pessoa sente que falta algo, o melhor é buscar ajuda profissional, como terapia, por exemplo. Porque quando ela busca se conhecer, lidar com os seus sentimentos e seus traumas, a sua identidade, a sua autoestima, ela pode não chegar a desenvolver a compulsão”, finaliza a psicóloga Fabiana Fuchs.

 

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