Equilíbrio

Síndrome de boreout: descubra o que é e como lidar com ela

Com sintomas parecidos ao do burnout, tédio no trabalho pede reflexão e mudanças práticas

por Thieny Molthini | Animação de Matheus Wohlenberg Atualizado em 14 set 2020, 11h45 - Publicado em 11 set 2020 07h00

Você começa a trabalhar em uma empresa e imagina todas as possibilidades que virão pela frente: desafios, reconhecimento, promoções, desenvolvimento de carreira… Mas os meses — ou anos — passam e as coisas não acontecem bem assim. Parece que ninguém vê suas habilidades ou reconhece a sua capacidade em fazer algo desafiador. Então, quando percebe, trabalhar é apenas um apanhado de horas que você quer que passe o mais rápido possível para poder ir embora. Só que esse desânimo pode ir além e impactar diretamente a sua saúde mental. Entenda, a seguir, o que é boreout e como lidar com essa condição.

O que é boreout?

“O termo ‘síndrome de boreout’ pode ser traduzido como ‘tédio no trabalho’ e se refere ao estado de apatia e desinteresse que tira o entusiasmo e o prazer em atividades cotidianas”

De maneira direta e descomplicada, “boreout” vem da palavra em inglês “bored”, usada para tratar algo entediante ou chato. Quando levamos esse termo para o ambiente corporativo temos a síndrome de boreout.

“O termo ‘síndrome de boreout’ pode ser traduzido como ‘tédio no trabalho’ e se refere ao estado de apatia e desinteresse que tira o entusiasmo e o prazer em atividades cotidianas relacionadas ao trabalho, há um sentimento de desconexão com a empresa”, diz Efigênia Vieira, psicóloga, psicanalista, headhunter e CEO da Upside Executive Search, empresa especializada na contratação de profissionais

Essa insatisfação, inclusive, não precisa de muitos anos de trabalho começar a aparecer. Para Ana Paula Carvalho, médica psiquiatra, o boreout pode surgir, por exemplo, quando a descrição do trabalho que é apresentada ao profissional antes da sua contratação não condiz com o que o cargo realmente demanda, resultando em tarefas pouco desafiadoras, abaixo do potencial do colaborador.

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Boreout X Burnout

De acordo com Efigênia, a grande diferença entre burnout e boreout está na causa do problema: a síndrome de burnout é caracterizada pelo estado de tensão emocional e estresse provocados por condições de trabalho desgastantes, enquanto a síndrome de boreout caracteriza-se pelo tédio causado pela falta de expectativas e motivação no trabalho.

“Vale ressaltar que ambas geram desequilíbrio, só que sob aspectos e tratamento diferentes: o burnout é considerado uma doença emocional, já a boreout pode ser resolvida na estrutura da empresa, na maneira como cada colaborador é tratado e considerado”, acrescenta Lara Dias, especialista em negócios e carreira da Support Business Group, empresa especializada em arquitetura de estratégias financeiras e econômicas.

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(Marcelo Santos/Getty Images)

De modo geral, o boreout aparece quando a pessoa já não tem estímulos no trabalho ou realiza as mesmas atividades, desenvolvendo pouco as suas habilidades. Mas, Lara Dias, pontua mais algumas situações comuns à síndrome:

  • Ter pouco trabalho e passar muito tempo sem atividades;
  • Receber menos responsabilidades do que poderia;
  • Realizar funções que não se adequam à sua qualificação;
  • Encontrar muitas limitações ao dar uma ideia inovadora;
  • Não ter seu trabalho reconhecido pelas pessoas;
  • Não ver oportunidades de crescimento na empresa;
  • Realizar atividades monótonas;
  • Condições precárias de trabalho;
  • Clima organizacional ruim;
  • Envolver-se em relações de competição e conflitos com colegas.

“Boreout ocorre quando me sinto desanimado, insatisfeito e sem ânimo para seguir adiante”, resume.

Sintomas e efeitos

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(Allan Powdrill/Getty Images)

De acordo com Efigênia, existem três sintomas iniciais: exigir pouco de si mesmo, realizar apenas o necessário para não perder o emprego e uma sensação profunda de aborrecimento e falta de interesse.

Mas, além desse tédio e desinteresse, os sintomas podem refletir ainda mais na saúde mental. “Tanto o burnout, quanto o boreout causam prejuízos emocionais, que comprometem ao mesmo tempo o aspecto físico e mental”, explica Luciana Mescolin, psicóloga da Rede Silvestre de Saúde. “Entre os sintomas comuns a ambas condições estão: alteração da pressão arterial, insônia, irritabilidade, doenças de pele e instabilidade psíquica, que pode se manifestar na forma de depressão, ansiedade, pânico ou fobia.”

Quando já não há satisfação em trabalhar é preciso parar e refletir. Efigênia lista algumas ações práticas para retomar a autoestima na rotina profissional:

  • Reflita sobre os motivos de estar neste trabalho;⠀
  • Estabeleça metas profissionais, dessa forma cria-se maior expectativa e propósito relacionada às atividades do dia a dia;
  • Experimente processos e competências diferentes dentro do seu papel na empresa;
  • Comemore os resultados;
  • Cuide da sua saúde mental, já que a desmotivação no trabalho também pode estar associada à ansiedade, depressão, pânico e uso de álcool ou outras drogas.

Se, mesmo assim, você não se sentir bem, busque ajuda profissional.

No entanto, vale repensar também se esse é o caminho profissional que você deseja seguir. Para Lara Dias, o boreout está ligado diretamente ao objetivo de vida de cada pessoa, por isso fazer algumas perguntas a si mesma pode ajudar nesse processo.

  • Qual tem sido o seu objetivo de vida?
  • Quais os planos que você traçou para si?
  • Se está insatisfeito nessa empresa, por que ainda está lá?
  • O que te impede de continuar a buscar pelos seus sonhos?

Autoconhecimento é parte fundamental para a identificação e saída desse estado”, explica a especialista em negócios e carreira.

Muitas vezes, o trabalho que o profissional exerce é importante para o seu sustento. Entretanto, não lhe dá sentido e propósito à vida. Portanto, é hora de rever a sua atividade ou de buscar meios de colocar em prática os seus talentos em outras áreas”, acrescenta a psicóloga Luciana Mescolin.

Three office workers standing in office, wearing party hats

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O papel da empresa

Converse com a pessoa que está acima de você, na liderança, explique o que está acontecendo e busque, junto com ela, alternativas. “Essa comunicação deve ser transparente e madura. Você precisa estar consciente de que o trabalho exercido é sua opção, não apenas um recurso financeiro“, ressalta Efigênia.

No caso do boreout, a cultura da empresa é o ponto principal para a prevenção da condição, por isso é essencial que ela entenda o seu papel. “Ela precisa criar ações e estratégias para evitar e diminuir esse sentimento de tédio dentro da organização”, comenta Lara Dias. “Entender as necessidades e os sonhos do colaborador, alinhar expectativas, ter bem definido — e ao acesso de todos — o caminho de crescimento dentro da empresa, estabelecer linhas claras de autoridades, construir equipes autônomas, disponibilizar ajuda psicológica e instituir a cultura da felicidade dentro da sua empresa são apenas algumas medidas eficazes para evitar a síndrome”, pontua Lara.

Se você tem um cargo de gestão em sua empresa, também deve ficar atento aos sinais, pelo bem de seus funcionários e também da empresa. Trabalhar com pessoas motivadas e apaixonadas pelo o que fazem é fundamental para que a instituição some bons resultados. Além disso, a síndrome de boreout pode ter consequências bastante negativas para os negócios.

De acordo com a advogada trabalhista Maria Inês Vasconcelos, gestores costumam identificar alguns sintomas comuns relacionadas a esses profissionais: “geralmente essas pessoas mentem muito, enganam, não são pontuais e são descomprometidas”, conta a advogada. “Elas ainda desenvolvem um certo rancor do patrão (alguns relatam ódio), justamente pelo ataque constante à sua autoestima”, acrescenta. E o antídoto pode partir da empresa, com a valorização do profissional e da sua autoestima.

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(Karen Moskowitz/Getty Images)

“Melhorar e prevenir o boreout dependerá de fatores da empresa, dos superiores e do trabalhador”

“Uma empresa dinâmica sempre busca avaliação e consultoria de seus métodos de seleção e estímulo de seus profissionais, além de ter como meta a identificação e valorização de talentos. A cobrança, por sua vez, acontece ao mesmo tempo em que a empresa oferece ferramentas de crescimento, como treinamentos e cursos”, analisa Luiz Scocca, psiquiatra pelo Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo e membro da Associação Americana de Psiquiatria.

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(Matheus Wohlenberg/BOA FORMA)

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