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Janeiro Branco: a saúde mental dos pacientes oncológicos

Tristeza, ansiedade e incertezas são problemas que impactam negativamente na qualidade de vida das pessoas diagnosticadas com câncer

Por Juliany Rodrigues
Atualizado em 31 jan 2023, 17h51 - Publicado em 31 jan 2023, 17h50

O diagnóstico de um câncer pode afetar os sentimentos e as emoções dos indivíduos. Além dos efeitos físicos, o tratamento dessa doença envolve uma série de medos, inseguranças e incertezas, fazendo com que a saúde mental do paciente seja profundamente impactada.

De acordo com a psico-oncologista Luciana Holtz, fundadora e presidente do Instituto Oncoguia, muitos apresentam queixas como dificuldade de dormir, ganho ou perda de peso, ansiedade, estresse, angústia e medo.

Ela também conta que há a possibilidade de confundir os efeitos colaterais do tratamento com outras alterações que surgem da parte mental, o que pode dificultar o diagnóstico de problemas como a depressão.

“Por exemplo, dependendo do tratamento, é esperado que a pessoa fique um tempo cansada ou fadigada. Porém, é preciso saber diferenciar se isso é um sintoma esperado do tratamento ou não, se é algo que exige um olhar mais atento de um profissional de saúde”, alerta a especialista.

Michele Salek, hoje com 32 anos, recebeu o diagnóstico de câncer de mama aos 26 e relata que, ao descobrir a doença, sentiu medo, principalmente, por não saber se o tratamento daria certo ou não.

Michele Salek com roupas de academia
Michele Salek | (Divulgação/Divulgação)

“No dia seguinte após ser diagnosticada, eu acordei e fui atrás de tudo o que tinha ao meu alcance para sobreviver, comecei a correr atrás de médico, de consulta e coloquei na cabeça que tudo o que eu mais queria era sobreviver e que eu faria tudo o que fosse preciso para isso”, diz, mostrando que, apesar das incertezas, não perdeu a disposição para lutar contra a doença.

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Mesmo após a cura, muitos indivíduos continuam lidando com um medo: a recidiva do problema. “Fizemos uma pesquisa que apontou que o medo do câncer voltar é algo muito presente na grande maioria dos pacientes. Geralmente, esse medo é bastante negligenciado, pois os pacientes pouco conversam sobre esse assunto e não encontram espaço para falar com a rede de apoio ou com os oncologistas, por exemplo”, aponta a psico-oncologista.

A IMPORTÂNCIA DA REDE DE APOIO

Mulher em tratamento oncológico conversando com outra mulher
O diálogo é importante | (freepik/Freepik/Reprodução)

Segundo Michele, que viu seu casamento não resistir ao tratamento do câncer, sua avó materna, de 89 anos, que mora no Rio de Janeiro, foi sua companheira durante o tratamento do câncer em São Paulo e um importante apoio para que ela conseguisse enfrentar a situação.

“Ela ficou comigo durante todo o período de quimioterapia e foi meu braço direito, porque a gente acaba se sentindo sozinha e com medo. Então, ela me ajudava com as refeições e me incentivava a reagir, pois tinham dias que eu ficava muito frustrada e na cama”, descreve Salek, que fez mastectomia nas duas mamas, 16 sessões de quimioterapia, 28 sessões de radioterapia e hormonioterapia.

Na maior parte das vezes, o diagnóstico de um câncer assusta os pacientes, deixando-os tristes, preocupados e pensativos. Por isso, seja dentro de casa ou em outros ambientes, como clínicas, hospitais e grupos online, ter pessoas com quem contar é fundamental para os pacientes. Essas relações precisam envolver o diálogo transparente, empático e cuidadoso, garantido que os indivíduos consigam se abrir e dizer o que estão sentindo.

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Além disso, uma rede de apoio ajuda a identificar caso o paciente apresente sintomas que possam indicar transtornos mentais mais sérios, segundo Luciana. “É preciso ter atenção quando a tristeza não vai embora, já que isso pode sugerir que uma depressão se instaurou, trazendo a necessidade de procurar um profissional da saúde mental”, destaca.

A AUTOESTIMA

Mulher careca se olhando no espelho
O tratamento oncológico provoca a queda de cabelo e outras alterações físicas | (freepik/Freepik/Reprodução)

O câncer pode destruir a autoestima de vários pacientes, já que os tratamentos utilizados para combater a doença trazem uma série de efeitos colaterais que impactam na estabilidade emocional e trazem desconfortos como a queda de cabelo, a necessidade de retirada das mamas, a mudança no peso e alterações cutâneas.

“A mastectomia em si não foi um problema para mim, pois na mesma cirurgia que tirei as mamas eu reconstruí e coloquei prótese”, inicia Michele.

Entretanto, Salek diz que o tratamento fez com que ela ganhasse peso, o que acabou prejudicando a sua autoestima. “Eu ganhei peso e isso acabou me afetando um pouco, pois eu sempre fui uma pessoa muito ligada ao corpo.”, detalha.

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“Eu perdi a sobrancelha, os cílios. Eu sempre amei me maquiar, falava que o meu item de maquiagem favorito era o rímel e, de repente, não tinha mais cílios. É uma situação transitória, mas que mexe com você sim”, acrescenta.

Em relação ao ganho de peso, ela aponta que teve dificuldade de perdê-lo mesmo após o término das terapias utilizadas para o combate ao câncer, mas que a prática de atividade física foi uma grande aliada para retornar a um corpo que ficasse mais satisfeita.

“Quando uma mulher passa pela mastectomia, ela sofre abalos na autoestima. Em hipótese alguma, devemos culpar ou desvalorizar as queixas e os sentimentos dessa pessoa. Essa retirada da mama representa a perda de um órgão extremamente importante para a mulher, que tem a ver com a feminilidade e sexualidade. Então, é muito importante explicar para a paciente o que pode acontecer, se após a cirurgia a reconstrução mamária pode ser imediata ou não e todos os outros detalhes”, inicia Luciana Holtz.

“A perda dos cabelos e dos outros pelos do corpo e a mudança de peso são outros aspectos que causam um impacto negativo na autoestima de inúmeros pacientes”, completa a psico-oncologista.

SAÚDE MENTAL

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Mulher careca com a mão na cabeça e expressão facial triste
A depressão é um problema comum entre pacientes diagnosticados com câncer | (SHVETS production/Pexels)

Para promover a saúde mental e o bem-estar dos pacientes oncológicos, Luciana Holtz destaca a importância do acesso à informação de qualidade.

“Se o paciente consegue driblar aquela confusão a respeito do que é uma fonte de qualidade, ele começa a se preparar e a prevenir certas coisas que podem ocorrer. Faz diferença saber que algo pode acontecer do que vivenciar algo do nada e sem nenhuma preparação. Além disso, também existem várias informações relacionadas aos direitos dos pacientes, às dicas de qualidade de vida e de suporte. Óbvio que essas coisas podem não valer para todo mundo, mas elas podem ser úteis sim”, pontua a especialista.

O psico-oncologista também desempenha um papel essencial quando o assunto é melhorar a qualidade de vida dos indivíduos diagnosticados com essa doença, uma vez que, de acordo com Luciana, esse profissional tem uma visão focada nos sentimentos e pode auxiliá-los, por exemplo, a encarar a jornada em busca da cura e na tomada de decisões.

Além de ter enfrentando um câncer de mama, Michele também vivenciou um quadro de depressão após o diagnóstico.

“Quando eu me dei conta que a depressão era uma doença como qualquer outra, eu fiz o que eu faria diante de qualquer condição: procurei um médico psiquiatra e fiz terapia com psicológo. Então, meu conselho é: encare a depressão como uma condição séria e que precisa de um tratamento adequado”, pontua.

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De acordo com Salek, que atualmente trabalha como assistente judiciária e é atleta de jiu-jitsu, a atividade física é o “maior antidepressivo” que já conheceu. “Tiveram vários dias em que eu não queria levantar da cama e o jiu jitsu me motivava”.

2ª EDIÇÃO DO FESTIVAL DO AUTOCUIDADO EM SAÚDE

A segunda edição Festival do Autocuidado em Saúde, liderada pelo Instituto Oncoguia acontece entre os dias 1 e 4 de fevereiro e tem o tema “Porque ser e se sentir saudável é possível: com ou sem câncer”. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas pelo site e pelo aplicativo do evento Festival Autocuidado Oncoguia, disponível na versão IOS e Android.

A edição aborda a importância do autocuidado e sua relação com a qualidade de vida, com o foco em alertar para a importância de se buscar uma vida com mais qualidade, mesmo ao lutar contra uma doença grave como um câncer.

No evento, é possível participar de rodas de conversas, palestras, aulas interativas, salas de bate-papo e workshops que promovem assuntos relacionados à importância de valorizar o autocuidado com a saúde física e mental.

 

 

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